sábado, 26 de fevereiro de 2011

Queria bater à sua porta, é que eu gosto de você, entende? E ele ia se assustar um pouco e logo ficar comedido de novo, pensando no que dizer..."eu fico muito lisonjeado", ele diria, sem jeito. Esperando meu próximo despropósito. Eu ia sorrir, sorrir até o corpo inteiro ser o sorriso só, o sorriso só...

quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

Mas deixara-se ao bel prazer, por isso o sorriso satisfeito e lânguido. Tinha deixado que o amor a devorasse crua, sem os talheres de prata. Sem a etiqueta, os cristais, os violinos...as frases previsíveis encadeadas...liberdade era aquilo, deixar-se a mercê; ele a enchovalhou, beijou-lhe a face, disse coisas bonitas, trouxe-a para junto de si, apalpou suas coxas. "Comeu meu nome, minha identidade, meu retrato". Destroçou-a. Bateu-lhe no rosto. Arregaçou as mangas e tratou ele mesmo da chibata e foi perdendo a conta. E ela agora, oferecida na mesa. A carne vermelha, sangrenta. Devorava-a sem cerimônia. Mas ela não tinha por quê fugir...natureza não se pode negar.

sábado, 19 de fevereiro de 2011

Howl - Florence and the machine

Uns amores assim repetidos numa cadeia, muito natural as incógnitas se seguindo, os números se acavalando nelas, sem forma; não entendo a equação, não sei interpretar. Já me disseram tudo, ó, até o valor do pi e eu não sei equacionar. Tanto livro, tanta teorema. E tudo que não cabia. Queria dizer à sua flor mais pálida e mais frágil que a amava até as lágrimas, assim, até o absurdo dos olhos verdes aguados dentro do miolo, confessar que se irritava muito muitas vezes com ela esmiuçando todos os fatos como um novelo, mas a amava desesperadamente, assim, uma tensão nas veias, do coração cordas pra tocar harpa pra ela. Queria subir num tom mto alto como da música e se jogar de lá de cima quantas vezes fosse necessário para perder um pouco desse exagero, desse descabimento todo. O amor vai nos matar, Ondina, é inevitável. Entrelaçamos os dedos, pra dar força. É destino. Se pudesse, diria a Deus: fique sabendo que eu amo demais para suportar.
Amava um mundo inteiro de coisas que lhe doíam o coração. E era só isso, um pedaço do todo. Difícil demais essa separação intransponível entre o que somos e o que amamos. As veias rugiam pra fundir, mas a pele não deixava mais. Sofria. E que tinha um puta medo disso tudo que devorava e dessa definitividade que é traçar uma linha torta e tênue e ver o traço grosseiro e retalhado do destino ir se sobrepondo, irreparável. Mas ele diria, ensaiar tiraria o sabor. Eu seria obrigada a concordar, e a me curvar, me curvar e aceitar o peso louco das asas largas demais e do amor muito longo, minha cruz de madeira, meu perjúrio, meu sacrifício. Meu corpo. Meu couro prometido num contrato. Minha cabeça na bandeja. Minha sentença. E eu aceitava...me curvava lentamente e aceitava o peso, o medo e a beleza daquele desgoverno. Oferecia o pescoço; era também se libertar. E eu aceitava. E sorria, até. Premeditadamente livre.

sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

A astrologia continua prometendo as mesmas coisas de sempre, e eu aqui, igual, réplica de ontem e de antiontem e da semana passada. Mas amanhã eu vou acordar cedo e ler o jornal e esquecer que inventaram essa caixinha cheia de imagens coloridas e gente sorridente. Ler o jornal e ver o dia ir clareando. Se pudesse, eu mudava desde agora, 23h e 11min. Talvez eu já possa mudar e cheirar o real, e querer o real, make it happen, dizem as propagandas. Às vezes trazem umas verdades - vá lá: tomar o destino inteiro nas mãos de novo. Sou eu e isso tudo é meu e eu quero fazer novo, fresco, ventania. Terra nas mãos e tato. Gosto.

domingo, 6 de fevereiro de 2011

Carol, eu queria te dizer que eu tô triste como um gambá e só quero ficar aqui ouvindo essas músicas tristes como o diabo, mas eu já tô chorando e não sei bem dizer...acho que em algum passado remoto as coisas tinham mais gosto e agora ficou batido e eu fiquei desinteressada, entende? Eu já amei tanta coisa...eu já amei com tanto desespero...e agora eu quero ganhar dinheiro e gastar em viagens, em shoppings, ia voltar naquela loja amanhã e parcelar tudo porque eu posso ficar assim fodida mas é preciso estar bem vestida, hum? E maquiada para a ocasião. A ocasião é que eu tô me sentindo sozinha e fodida e perdida e eu queria um abraço daqueles que só o homem da nossa vida pode dar, eu quero ir embora pra casa, estou cansada dessa ventania, dessa música alta, eu quero sentir o cheiro de casa de novo e ser abraçada inteira...quero amar direito, porra. Sem essas graças, essas firulas, esses poréns. O tempo vai passando e a gente vai simplificando mais tudo porque fica com medo, não é? Mas eu olho hoje e vejo um monte de grãozinhos de nada, mas não era isso que eu queria, não foi pra isso que eu vim aqui! Sabe, quando eu deito peço pra esquecer e que faça sol no dia seguinte...um sol bonito e passe ele bem embaixo da minha janela com uma voz de quem ficou aqui o tempo todo e falou comigo ontem à noite, veja, pouco tempo mas eu tinha esquecido! Como fora esquecer? Sim...e lembrar que estava esperando que viesse me buscar pra me levar pra casa.