sexta-feira, 14 de agosto de 2009

Ainda que.

É, eu vi sim. Mudou de contato, mudou todos os amigos. Mudou os lugares. Mudou o cabelo, as roupas. Fiquei pensando praonde terá ido a sua paixão; se ela ficou, se se consumiu. Se você se lembra. De tudo o que nós dizíamos, de todas as vezes, lembra, hein? Pois não lembre. Estou bem sem você, só escrevo pra não mandar porque me disseram seu nome hoje, e eu já tinha praticamente esquecido que delicadeza continha esse seu nome curto e simples. Não faz mais muito efeito em mim, é fato; mas decerto me lembro de antes. Sim, antes. Quando seu nome me revirava as entranhas e me punha do avesso. Me fazia fugir, gritar, fazer qualquer coisa que não fosse você. Ou antes ainda, simplesmente lembrar e rir, ela?! Aquela maluca! Minha maluca que atravessava a sala como a gata, fingindo não ligar pra mim. Mas algo no jeito de andar denunciava. Ela me esperava, ela suspirava. E o mundo parecia tão fácil e o amor tão óbvio com você na minha varanda, andando descalça e teimando em pisar a terra e catar as amoras que eu te mandei parar de catar mil vezes. Não ouvia, ficava feito criança domingo. Ah, domingo! Porque domingo era nosso, nosso dia absoluto de namorados. Quatro da tarde e o tempo nos esperando ser felizes, eu deitado no seu colo deixando a mão no cabelo me embalar. Não sei porque, minha flor, o encanto se perdeu. Foi ficando difícil, foi ficando chato. Então devíamos ir embora. Minha garotinha apaixonada, entretanto, nunca queria o que devia. E mesmo que soubesse que devia não admitia, não queria – esperamos que aquele amor que atravessa tudo durasse para sempre, não? Pois ele não resistiu a nós mesmos, minha flor. Não resisitiu e fomos embora, amargo demais. Ficou ainda mais amargo sem você, quando passei para todo o resto – todo o resto tão interessante e tão passageiro, hein? Tanta coisa e tudo tão vazio. Perdôo todas as vezes que você gritou porque aquilo sobretudo era amor. Me perdoe por todas as vezes que te deixei me esperando. Como daquela vez que você escreveu, o vestido branco, pendurado no armário, sempre esperando. O lápis de olho desenhando bonito, mas você chorou e ficou só a borra preta debaixo dos seus olhos. Desculpe ter feito doer, amor. Não foi por mal. Não me acuse. Vi agora mesmo o seu olhar indignado, mas...! Xiu. E aí veio a razão, minha flor, você se cala. Ainda meio revoltada. Me oferece a expressão carrancuda, está com raivinha apesar de ter tanto motivo fica tudo pequenino, quando você joga. Rio porque você não vai agüentar, nem eu. Caímos na nossa própria peça, menina. Rio como quando eu amava você, rio por nada, por você, por tudo, não é mesmo engraçado?! Rio porque não tem graça. Mas não, não fique amarga, minha flor, amarga você fica pesada. Pega aquela rosa que eu te dei e nós plantamos no jardim, enchemos as unhas de terra mas não faz mal, terra é bom; pega a rosa e você vai entender, já já vai entender e ficar quietinha, e ficar em paz. Deita no sofá, fecha os olhos, deixa a claridade suspender o tempo, deixa aquele amor antigo se embrenhar suave na tua pele, te cobrir, te aninhar. Acalma o coração, não chora. Vai ficar tudo bem. E a gente já tá tão longe, e o amor?! Acabou. Mas não importa, não importa. Importa é que fazia sol, fazia um sol lindo de tarde, mesmo que a gente se aborrecesse. Fez sol. E eu sei que às vezes você ainda veste aquela camisa que você ia me dar mas não deu. Era uma promessa, seus dedos traçando os fios como se conhecessem o caminho. Ficou inacabada. Veste só às vezes, quando fica sozinha em casa e faz aquele frio insonso. A casa inteira vazia, vazia. Deixa eu te pedir, não veste não, menina. Só deixa a claridade bater no seu rosto, esquece o frio, esquece esquece esquece. Você fica tão bem quando está em paz; sabe, parece até que Chico toca mais suave quando eu te vejo assim. (Me deixa fingir, e rir...)

3 comentários:

  1. toda vez que você escreve assim, eu termino de ler com um nó na garganta.
    fico sufocada...
    vai lá no fundo, sabe? naquela ferida que a gente não consegue curar.

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  2. Cara, eu AMO esse teu texto. Concordo com o comentário acima, a gente fica com um nó na gargata (gosto do texto sempre que me causa essa sensação), uma vontade de viver o amor cada dia mais. E sabe o que é mais pesado? Tenho pensado que quem tem chance/coragem de viver um amor de verdade sempre paga caro por isso. Vou salvar.
    Obrigado por postar.
    Beijo.

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  3. Impressão minha ou eu vi um outro texto aqui. oO
    Na hora em que fui comentar sumiu.
    Não vou guardar as palavras, mas depois comento de novo.


    'Você sempre me dói, sempre. Tem a capacidade de doer de tão lindo que escreve, entende? Sempre gostei de vir aqui, desde o começo, desde a época da foto com decote e flores. A Insolente, que se atreve a tocar a gente tão fundo quanto toca. Gosto daqui, muito.
    Um beijo.'

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