segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

Foi depois dela, Reinaldo. Olha, a Luiza me trancou do lado de fora do apartamento e ficou lá chorando, como se não fosse suficiente todos aqueles tipos de vingança que ela inventou. Depois que descobriu, quebrou o vaso preto chinês que a mãe tinha nos dado de presente de casamento, e disse que era tudo culpa dela. Pegou meu cartão de crédito e foi fazer umas coisas absurdas na rua, acho que até um spa pra pés, acupuntura, yoga. Essa foi a fase do ódio, não sei quantos meses eu vou pagar as prestações daquelas joalherias todas. Ela sumiu com o meu cachorro, Reinaldo, e jogou umas coisas pela janela, até um relógio muito antigo que eu tinha herdado do meu avô. O cachorro era tão bom, Reinaldo, não sei porque implicava tanto com ele. Rasgou minhas camisas porque disse que tinham cheiro de mulher. Ficou dias mergulhada na banheira chorando, e quando eu tentava conversar ela saía andando, dizendo não toque mais em mim. Como se eu fosse sujo. Depois ficou muito triste, com os olhos fundos, cansada, dizendo que fez de tudo pro nosso casamento dar certo, perguntando porque porque porque. A Cátia ligou lá pra casa e me chamou de muita coisa, falou até em suicídio, fazer uma coisa dessas com a pobre mulher! E desligou na minha cara. Mas você precisa saber, Reinaldo olha, eu fui fiel durante todos esses anos. Foi depois daquele dia...eu quis tanto aquela mulher, se deixar eu passo o resto da vida só procurando ela por aí, só pra saber que gosto tem. Ela veio e naquele dia fazia muito frio e nós ficamos muito próximos, à meia luz brilhava como uma fada, os olhos enormes, perversos e sonsos. O martini nos lábios reluzindo como um espelho, ela andava e ria daquele jeito, com o passo decidido mas meio insegura, tímida. Eu queria ela pra mim, Reinaldo. Mas quando viu a aliança larga e dourada no dedo pegou o martini e saiu andando, deixou o copo vazio e triste em cima do balcão com umas mãos que ficavam um pouco, só um pouco mais. E se foi. Nunca mais a vi em lugar nenhum, Reinaldo, veja você, esse lugar aqui é tão pequeno! Nem na rua, nem em outra cidade. Não a tive e depois dela precisei de todas as mulheres de cabelo escuro que bebiam martini, que riam sem graça, que tinham as unhas vermelho sangue e deixavam as mãos, e essas eu alcançava, ficavam lá até que eu as alcançasse. Sinto que jamais encontrei o gosto dela como certas coisas tem o gosto que parecem ter. O nome dela é Ana, Ana Beatriz, você não a viu por aí, Reinaldo? Podemos por anúncio no jornal, oferecer recompensa pra quem souber dela. Foi assim que eu vim parar aqui, meu amigo, naquela noite fazia uma semana que a Luiza tinha ido passar férias na casa da mãe, ameaçando se divorciar de mim e ficar com o meu carro. A Luiza sempre foi assim complicada e nenhum homem na Terra pode ter paciência pra isso, não é verdade?! Mas o diabo foi ter ficado sem luz lá em casa por causa da árvore que caiu nos fios com a chuva, e eu resolvi ir beber um conhaque naquele maldito lugar.

Um comentário:

  1. nossa, que bonito. chega a dar uma onda, essa pressa, essa intensidade.

    beijo

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